terça-feira, 9 de outubro de 2012

Software Livre não é software gratuito: uma outra lógica do software livre

É bastante comum, principalmente entre as pessoas não iniciadas na temática, confundir software livre com software gratuito.

Antes de entrar propriamente na discussão, gostaria de fazer, de uma forma rápida e sucinta, uma pequena descrição sobre as três categorias mais comuns de software, ao menos em termos de “comercialização/circulação”

- Software Proprietário: possui restrições impostas pelo seu criador, geralmente relacionadas ao pagamento de algum tipo de licença para ter sua utilização liberada. Estes softwares comumente possuem algum tipo de patente ou são registrados sob alguma lei de copyright e/ou propriedade intelectual;

- Software Gratuito: sua utilização não implica no pagamento de uma licença de uso, entretanto existem limitações, como, por exemplo, a não liberação do seu código-fonte para os usuários, impedindo ajustes e customizações no código, dentre outras limitações;

- Software Livre – permite aos seus usuários desfrutar de quatro liberdades, garantidas pela licença de uso GNU GPL (GNU General Public License ou Licença Pública Geral), a mais utilizada pelos projetos de software livre. São elas1:

. Liberdade para executar o programa;
. Liberdade para estudar o programa e adaptá-lo a sua necessidade. Para isso, é necessário que o software seja open-source, ou de código aberto;
. Liberdade para redistribuir cópias do programa;
. Liberdade para aperfeiçoar o programa e liberar as modificações.

É crença comum associar a cobrança de valores ao definirmos o tipo de software: se existe um valor a ser pago pela licença de uso, é proprietário; se não tem, é gratuito ou livre. Ou seja, a definição do tipo de software dar-se-á apenas por motivos financeiros. Acontece que até mesmo o software livre pode ser cobrado e isso não faz dele um software proprietário. O que geralmente acontece, neste caso, é a cobrança por algum serviço agregado ao software, como, por exemplo, uma caixa para embalar a mídia que contem o software, um manual de instalação, um contrato de suporte, dentre outros.

Uma outra crença é associar a cobrança de valores à qualidade do software. Quem nunca ouviu as expressões “se é de graça é ruim!!!” ou “não existe almoço grátis!!!”???. Não existe mesmo.

Quando pensamos apenas em uma redução de custos ao adotar o software livre, caímos na velha armadilha da utilização apenas instrumental, de consumo da tecnologia, e não partimos para um entendimento de outras dimensões que estão por trás da adoção das plataformas livres, como a produção livre, compartilhada e colaborativa de saberes e conhecimentos.

Primeiro, temos a questão da propriedade intelectual X a criatividade. É comum ouvirmos argumentos de que a propriedade intelectual favorece a criação e a qualidade dos produtos e que se não houvessem proteções desse tipo não haveria interesse em criar ideias e produzir, incluindo ai os softwares, já que não seria possível cobrar por essa ideias e auferir lucro. Acontece que a produção de software livre tem mostrado exatamente o contrário. Ela acontece de forma acelerada e conta com uma grande quantidade de colaboradores ao redor do mundo, produzindo ferramentas cada vez melhores, mais robustas e criativas que, não raro, são melhores tecnicamente que os softwares proprietários.

Acontece que justamente por contar com um grande número de colaboradores em seu desenvolvimento, o software livre pode ser permanentemente melhorado, tornando-se cada vez mais robusto e confiável. A esse respeito, é quase regra do mercado de software proprietário ao afirmar que grupos muito grandes de desenvolvedores tendem a ser difíceis de controlar, o que acaba refletindo na qualidade, e inclusive no custo, do produto final. Por isso as equipes devem ser enxutas, com os envolvidos tendo uma visão limitada do que estão fazendo, uma vez que lhes compete realizar apenas determinadas rotinas.

Quando penso em software livre imagino justamente o contrário: mesmo que uma maior quantidade de pessoa trabalhando coletivamente para o desenvolvimento de um software possa levar a uma maior incidência de falhas, esse mesmo grande número de pessoas tende a solucioná-las de forma mais rápida e criativa. Neste caso, quanto mais pessoas, menos erros. Quanto menos erros, melhores produtos. Ou seja, quanto mais pessoas participam do processo, seja desenvolvendo, distribuindo, divulgando ou contribuindo de alguma forma, mais o software livre tende a ser fortalecido. Afinal, a sabedoria popular diz que o olho do dono é que engorda o boi! Quanto mais “donos”, mais o “boi engorda”,

O software livre é muito mais que uma questão meramente técnica ou de mercado, existindo outras questões fundamentais em sua concepção.

A adoção de software livre pode, também, promover o surgimento e o fortalecimento de novas práticas baseadas nos seus ideais de liberdade, colaboração e compartilhamento. Atitudes em torno do compartilhamento e da livre circulação de ideias, da produção e não da reprodução do conhecimento, por exemplo, podem ser fortalecidas. Também, práticas de quebra de patentes de produtos vitais para todos, como a dos medicamentos, podem ser inspiradas nos fundamentos do software livre.

Para quem ainda não acredita no potencial das tecnologias livres, temos, dentre vários, o exemplo do sistema operacional GNU/Linux, que prova que esse modo de produção, aberta e colaborativa, pode, sim, ser extremamente viável.

A lógica por traz do movimento do software livre vai muito além das questões técnicas. O seu significado social e político pode ser tão ou muitas vezes mais importante que os aspectos técnicos envolvidos, uma vez que pode ser um passo importante para solidificar a ética e os pensamentos da filosofia livre em toda a sociedade.

Neste ponto, por que não pensarmos em uma correlação entre software livre e educação? Não seria essa educação que buscamos, coletiva, colaborativa, de qualidade, que ultrapasse a questão instrumental da utilização das TIC e promova um amplo debate que inclua o engajamento político, a coparticipação, a construção coletiva e a ênfase na criação?

1Ver detalhes em http://www.gnu.org/

terça-feira, 2 de outubro de 2012

Alfabetização e letramento como pré-requisitos para o Letramento Digital? Alguns questionamentos.


As leituras a cerca das temáticas de letramento e letramento digital me trouxeram o início da discussão que coloquei em meu post anterior a respeito de inclusão digital. O termo letramento digital é autoexplicativo? Seria o letramento em ambientes digitais? E a alfabetização digital, onde entra nessa conversa?

Magda Soares, em seu texto “Letramento e alfabetização: as muitas facetas”1, alertando para uma possível contrariedade de sua proposta, discorre sobre a impossibilidade de separar alfabetização e letramento. A autora afirma que a alfabetização se dá por meio de atividades sociais de leitura e escrita, ou seja, através de práticas de letramento, sendo que este depende da alfabetização, com seus sistemas alfabético e ortográfico, para se desenvolver. São simultâneos e interdependentes, em uma concepção mais atual.

Transpondo para o ambiente digital, e de uma forma um tanto quanto simplória, podemos acreditar então que a Alfabetização Digital seria apenas o manuseio técnico das máquinas, enquanto que o Letramento Digital, mais do que a alfabetização digital, seria a “fluência” com as máquinas e a internet, com a compreensão das complexidades dos processos de leitura e escrita digitais próprias destes?

Pensando dessas forma, será que apenas dispor do suporte digital já garante o letramento digital para alguém “letrado” (desculpem, mas não encontrei termo melhor!)? Será que uma pessoa dita “letrada”, além de ser alfabetizada digital, pode ser instantaneamente considerada letrada digital?

Acredito que pensando assim, esquecemos as muitas particularidades e características inerentes aos suportes digitais. O hipertexto, como bem lembra o amigo Daniel, por exemplo, com sua não-linearidade, reina, criando novas formas de estruturarmos nossos textos, com inúmeros caminhos e possibilidades que podem ser a qualquer momento seguidos.

E as diferentes mídias suportadas pelos ambientes digitais; músicas, vídeos, animações, dentre outros, que promovem uma quase infinidade de formas de se expressar e que ampliam as maneiras tradicionais de leitura e escrita? Será que o letramento digital é reservado unicamente para as gerações contemporâneas, que já nasceram imersas e interconectadas? Ou será justamente o contrário, uma vez que muitos desses imersos fazem apenas leituras rasas, a chamada leitura dinâmica, quando encontram materiais mais densos e volumosos na rede? Será que os imersos também “desaprenderam” a escrever ou estão criando uma outra (ou nova) forma de escrita mais condizente com a, chamada por Baumann2, “geração facebook”?

Acho que, em se tratando de letramento digital, nada é tão exato que não possa ter várias interpretações.

O texto da profa. Bonilla3, por exemplo, traz à tona uma discussão que poderia parecer impensável há algum tempo: a possibilidade de pessoas, crianças e adultos, ainda em processo de alfabetização ou que não estão completamente alfabetizadas poderem utilizar o computador. O comportamento de muitos desse sujeitos ante o computador parece provar que isso é possível. As pessoas podem ter algum nível de letramento mesmo que ainda não alfabetizadas, e ainda têm a possibilidade de se apropriar de uma forma plena das potencialidades das tecnologias digitais a partir da sua interação com as mesmas.

Em minha pesquisa de mestrado, que versou a respeito das possibilidades da utilização das tecnologias digitais no apoio ao professor no processo de alfabetização de jovens e adultos, convivi com alguns depoimentos que realmente foram surpreendentes. Por exemplo, ouvi o relato de um aluno em processo de alfabetização inicial que tinha uma conta no Orkut (bastante usado na época), sendo que este recebia o apoio dos filhos para as atualizações do seu perfil. Surpresa também foi saber ainda que muitos dos adultos analfabetos andam de transporte coletivo e fazem compras com desenvoltura, grande parte das vezes sem nenhum auxílio.

Enfim...espero que as nossas discussões a respeito do tema sejam bem frutíferas e possam trazer muitas respostas para minhas inquietações....ou então, suscitar novas perguntas!!!


1 http://www.moodle.ufba.br/file.php/10203/Textos/alfab_letra_soares.pdf
2 Veja mais em http://www.harleivrosa.blogspot.com.br/2012/03/dialogoscom-bauman-muitoboa-entrevista_26.html
3 http://www.moodle.ufba.br/file.php/10203/Textos/nao_sei_ler_logo_nao_posso_usar_computador.pdf

sábado, 29 de setembro de 2012

Inclusão digital: inserir ou realmente incluir?

Muito férteis têm sido as discussões coletivas a respeito dos temas abordados no decurso da nossa disciplina. Com o tema Inclusão Digital não poderia ser diferente.

Em um primeiro momento, podemos achar que o termo é autoexplicativo: ora, inclusão digital significa incluir digitalmente, certo? Depende do ponto de vista...ou não!

O termo inclusão, de certa forma, é sempre bem visto e aceito onde quer que seja utilizado: inclusão social, inclusão no mercado de trabalho, inclusão digital... Incluir, resumiriam alguns, é criar estratégias que possibilitem que os sujeitos tenham acesso àquilo que lhes falta. Incluir, então, seria um 'ato de bondade' dos que estão “incluídos” perante os desafortunados “excluídos”.

Seria esse, então, o motivo do termo ser tão deleitável para a maioria das pessoas? Valendo-se disso, as políticas públicas (ou políticas de governo, já que muitas mudam de acordo com o partido que domina o cenário político do momento) se valem do discurso da inclusão para melhor aceitação ao invés de se debruçar à luz do verdadeiro problema que está posto? A inclusão serviria somente, como comenta o colega Júlio, como bandeira política para a captação de recursos que serviriam a projetos desarticulados e sem sintonia com os anseios dos cidadãos?

Podemos perceber que muitas ações de inclusão digital partem do princípio que esta se dará (e estará completa) a partir do momento em que os sujeitos, ora ditos excluídos (ou não incluídos), tenham acesso aos artefatos digitais, aqui vistos como computadores, laptops, tablets, e seus congêneres. Pois bem, partindo desse princípio, a solução para o “problema” seria então facilitar a aquisição desses artefatos por meio de ações que proporcionassem a redução do preço final dos equipamentos, através, por exemplo, da redução da carga tributária, da ampliação das linhas de crédito tanto para compradores quanto para os fabricantes, dentre outras campanhas.

Além de facilitar a compra dos artefatos, o treinamento dos novo “usuários” seria parte fundamental do “pacotão inclusivo”. Programas para capacitar no uso das tecnologias seriam fundamentais para a criação de uma força de trabalho melhor, mais produtiva e apta, que esteja pronta para fazer um melhor uso de todo um ferramental contemporâneo no intuito de maximizar a sua produtividade.

Seria isso o que podemos chamar de inclusão digital? Essa lógica de mercado, que visa criar consumidores ávidos por adquirir novos produtos, aliada a mera instrumentalização, que tem como objetivo capacitar mão de obra para o mercado de trabalho, podem ser consideradas como elementos para que alcancemos uma verdadeira inclusão digital?

Mesmo que a capacitação para o uso dos recursos tecnológicos e a democratização do acesso as tecnologias digitais, incluindo a ampliação dos acessos à internet com qualidade, sejam consideradas ações válidas, elas, por si só, não garantem que os sujeitos se tornem participantes ativos, produtores de conhecimento, cientes de sua realidade e capazes de transformar verdadeiramente as estruturas excludentes da sociedade.

A questão talvez seja não apenas incluir, mas como incluir. Uma verdadeira inclusão digital deve superar o pensamento de que incluir seja adaptar os sujeitos a um modelo existente, ela deve ser dotada de um significado que contribua para a articulação das pessoas no uso das tecnologias para que estas possam buscar sua autonomia diante das suas demandas.

E neste ponto, onde ficam as políticas públicas, grande parte das vezes desarticuladas e a mercê de interesses tão amplos e difusos que não conseguem alcançar nenhum objetivo concreto? E falando em objetivos, qual seriam os das políticas inclusivas? A quem eles atendem?

Quando vivermos em um país livre das desigualdades, é bem provável que os conceitos de inclusão não façam mais sentido...ou não!

terça-feira, 22 de maio de 2012

TECNOLOGIA ASSISTIVA: muitos conceitos, novas descobertas

Ao ter contato com o termo Tecnologia Assistiva pela primeira vez, achei tratar-se apenas da utilização de equipamentos/dispositivos tecnológicos, mais propriamente baseados em tecnologias digitais, para apoiar pessoas com limitações das mais diversas ordens, sejam físicas, de aprendizado, dentre outras. Ao ler os materiais sugeridos para o seminário de TA, a ser conduzido pelas colegas Adriany e Priscila, descobri que é muito mais do que isso.

Podemos entender Tecnologia Assistiva como um conjunto de recursos (incluindo equipamentos, produtos, práticas e serviços), dotados de recursos tecnológicos ou não, que visam promover a inclusão de pessoas portadoras de necessidades especiais ao contexto da sociedade atual. Dessa forma, um recurso de TA pode ser tanto uma cadeira de rodas, uma bengala ou uma prótese, que apoiam e auxiliam à mobilidade, quanto softwares de computador que sejam acessíveis a pessoas com diferentes limitações, como, por exemplo, leitores de tela para apoiar usuários com restrições visuais, dentre outros.

O texto de Teófilo Galvão1, por sua vez, afirma que Tecnologia Assistiva é um conceito novo, ainda em construção, com várias classificações e definições em diferentes países, o que amplia o entendimento de TA para além da utilização de equipamentos ou ferramentas, incluindo também a criação de manuais, normas, estratégias e metodologias, dentre outros, que favoreçam a inclusão e autonomia do indivíduo com necessidades especiais.

Diante dos vários conceitos abordados nos textos e relacionado a TA, que vão dos mais abrangentes aos mais restritivos, um dos que mais me chamaram a atenção foi o conceito de Desenho Universal, que, ainda segundo Teófilo Galvão, “[…] trás consigo a ideia de que todas as realidades, ambientes, recursos, etc., na sociedade humana, devem ser concebidos, projetados, com vistas à participação, utilização e acesso de todas as pessoas.”, e que ainda “[...] transcende a ideia de projetos específicos, adaptações e espaços segregados, que respondam apenas a determinadas necessidades.”. Para o autor, todas as pessoas, sejam portadoras ou não de necessidades especiais, deveriam ser contempladas nos projetos de ambientes, recursos, softwares, dentre outros, evitando separar e classificar os sujeitos em “com” ou “sem” limitações, possibilitando uma sociedade mais inclusiva e justa para todos.

Particularmente, gosto muito do viés inclusivo, potencializador da inclusão social, do conceito de Desenho Universal, também por ele envolver outros grupos excluídos socialmente, como, por exemplo, as camadas mais carentes da população. Porém, tenho várias dúvidas sobre o conceito, inclusive a respeito da sua aplicação, principalmente por tratar-se de algo que precisaria atender às mais variadas necessidades, o que poderia até inviabilizar uma possível implantação.

Será que na intenção de projetarmos um software, por exemplo, que pudesse ser utilizado por toda e qualquer pessoa, independente de possuir alguma deficiência ou não, não poderíamos, de certa forma, dada a abrangência do artefato, criar um produto que não consiga atender bem a ninguém? Será que a solução, nesse caso, não seria que todo e qualquer software (ainda no mesmo exemplo) pudesse ser “completado”, via plugins (programas que adicionam novos recursos/funcionalidades) a depender da necessidade?

E quais as potencialidades das TA´s no contexto educacional, principalmente no que diz respeito a uma educação autônoma, emancipadora, participativa e colaborativa? Estamos fazendo da educação algo nos moldes do Desenho Universal? Em que sentido? São apenas provocações!!!!

Tecnologia Assistiva é um tema muito atraente, que gera ótimas e enriquecedoras discussões. Um ótimo seminário para todos nós!


1GALVÃO FILHO, T. A. A Tecnologia Assistiva: de que se trata? In: MACHADO, G. J. C.; SOBRAL, M. N. (Orgs.). Conexões: educação, comunicação, inclusão e interculturalidade. 1 ed. Porto Alegre: Redes Editora, p. 207-235, 2009.

Imagem disponível em: www.sect.am.gov.br/noticia.php?cod=7618

terça-feira, 15 de maio de 2012

As tecnologias móveis favorecendo a inclusão digital

Atualmente, é difícil pensar em comunicação e informação sem mencionar as tecnologias digitais móveis. A mobilidade foi, sem dúvida, um dos grandes avanços pelos quais a computação passou, proporcionando uma maior disponibilidade de acesso aos recursos computacionais, independente de hora ou lugar.

O desenvolvimento das tecnologias sem fio (wireless) e dos equipamentos digitais móveis (celulares, smartphones, notebooks, dentre outros), deu liberdade para que possamos nos comunicar, estudar, trabalhar, ou simplesmente nos entreter, mudando a forma como nos relacionamos com outras pessoas e com os espaços urbanos. As cibercidades, definidas por Lemos (2007) como cidades que possuem infra-estrutura de redes que possibilitam a conexão e comunicação dos mais variados dispositivos móveis, se constituem em novos ambientes de acesso à informação e a comunicação, os chamados “territórios informacionais”, definidos pelo autor como “[...] áreas de controle do fluxo informacional digital em uma zona de intersecção entre o ciberespaço e o espaço urbano”. (2007, p. 128).
 
Os equipamentos digitais móveis se constituem, também, em importantes dispositivos de participação e engajamento político-social das mais diversas ordens. Podemos, por exemplo, acompanhar a todo instante várias situações que talvez não tivessem a mesma magnitude não fossem as transmissões, muitas em tempo real, proporcionadas pelos registros feitos em dispositivos digitais móveis. Os protestos do mundo árabe, envolvendo o oriente médio e o norte da África, por exemplo, foram amplamente divulgados através de vídeos das manifestações feitos pelas câmeras de aparelhos celulares e smartphones, que varreram o mundo através das redes sociais, com o intuito de informar a população mundial a respeito da repressão que os habitantes dessas regiões padecem.
 
Dentre as inúmeras vantagens das tecnologias móveis, uma que me chama bastante atenção diz respeito ao seu potencial inclusivo. Ao meu ver, os dispositivos móveis e a mobilidade podem favorecer os processos de inclusão digital por vários motivos, principalmente pela redução do custo de comunicação e disponibilidade de uso.

O custo de um aparelho celular, mesmo o dos smartphones mais simples, dotados de recursos para navegação web, geralmente é mais baixo que o de um computador, o que ampliaria a possibilidade de aquisição por pessoas de renda mais baixa, o que, de fato, já se comprova, visto a forte presença do telefone celular junto à grande parte da população. Aliado a isso, as pessoas poderiam utilizar os hotspots públicos, cada vez mais comuns nas grandes cidades, o que dispensaria o custo de possuir uma infraestrutura de conexão à internet em suas residências.

A facilidade de portar os aparelhos menores (smartphones, tablets ou mesmo os celulares), também aumenta as possibilidades do acesso a dados e informações a qualquer momento e em qualquer lugar, possibilitando uma comunicação permanente entre as pessoas. Além do acesso, as possibilidades de produzir e socializar informação, a comunicação bidirecional (“todos-todos”) típica das mídias “pós-massivas”, também são ampliadas, uma vez que os dispositivos são mais facilmente transportados e possuem uma maior autonomia de bateria.

Os processos comunicacionais são cada vez mais fortemente facilitados pelas tecnologias digitais móveis. A inclusão sócio-digital pode se constituir em mais uma das vantagens proporcionadas por essas tecnologias, não só no que tange à redução no custo de aquisição do hardware como também por potencializar e ampliar um maior fluxo comunicacional entre as pessoas, favorecendo práticas coletivas e também colaborativas de socialização, de troca de informações e de construção do conhecimento.

terça-feira, 8 de maio de 2012

Seminário sobre convergência

Contribuindo com a discussão a ser realizada no seminário dos colegas Maria Helena e Pedro, trago alguns pensamentos e, claro, inquietações referentes à temática.

A palavra convergência, no sentido de direção, tender a um mesmo ponto, me remete a ideia de rigidez e controle, através da centralização, que pode levar à uniformização. Contudo, quando falamos em convergência, mais especificamente a convergência digital, a ideia de controle, ao menos em certo ponto, cai por terra.
A convergência entre algumas das tecnologias presentes em nosso cotidiano - computador, televisão, telefone.. - possibilita que um maior número de pessoas tenha acesso aos recursos digitais disponibilizados para essas plataformas, permitindo um maior alcance à informação, uma vez que eles, separados, não teriam o mesmo potencial.

Porém, muito mais do que simplesmente articular diferentes mídias, penso que a grande força da convergência digital está, justamente, em favorecer a interatividade entre seus usuários, onde o antigo espectador, ou telespectador, passa a ter muito mais poder de decidir, de opinar, de interferir, enfim, de participar mais diretamente do processo de produção de conteúdo, ao invés de apenas reagir mediante alternativas previamente definidas (mudar de canal, por exemplo). As pessoas passarão de meros receptores  a criadores de conteúdo, de opinião, de conhecimento, através de uma cada vez mais intensa troca de informações.

Dentro desse contexto, a Tv digital apresenta inúmeras possibilidades futuras de participação e intervenção dos usuários, não mais telespectadores. As potencialidades apresentadas são inúmeras, inclusive a de que possamos interferir diretamente na programação, por exemplo, algo muito maior do que apenas expressar nosso ponto de vista, passando, também, a ter o controle da situação.

Uma questão que me surge no momento, mais especificamente com relação a Tv Digital, foi (é e será) a necessidade do estabelecimento de novos padrões e a criação de plataformas que possibilitem a execução de aplicações, além dos cuidados com a infraestrutura que suportará a circulação das informações.

Pois bem, além de pensarmos nas questões técnicas, creio que seja de fundamental importância refletir sobre o alcance da Tv Digital à todas as camadas da população, principalmente as mais carentes, que normalmente têm mais dificuldade de acesso às “novidades tecnológicas”. Nesse sentido, penso ser fundamental a criação de políticas públicas que favoreçam essa inclusão, inclusive a qualidade dessa inclusão, principalmente no que tange a redução dos custos dos serviços de conexão e de hardware.

Uma das premissas poderia partir do incentivo à melhoria da infraestrutura de conexão e comunicação, promovendo a entrada de novos provedores com melhores e maiores backbones de alto desempenho. Aliado a isso, seria de fundamental importância estimular a utilização de software livre na criação de aplicações para a Tv Digital, aplicações abertas e livres, que potencializariam a interação e a participação de um maior número de pessoas na criação e circulação de conteúdo para essa nova realidade.

Para “pôr lenha” na discussão: mesmo com alguns autores desassociando a convergência de um dispositivo tecnológico em especial, atualmente é realmente possível separar a convergência das tecnologias digitais?

Um ótimo debate a todo nós!!!

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Seminário sobre interatividade – 08/05/12

Amigos,

próximo dia 08, terça-feira, eu, Sigmar e Ugo traremos para a discussão o tema INTERATIVIDADE, por isso, gostaríamos e agradeceríamos bastante a participação dos(as) companheiros(as) de disciplina na construção do nosso seminário. Sintam-se à vontade para alterar, sugerir temáticas, concordar, discordar....enfim, remixar o nosso plano para o seminário, que segue abaixo:

Proposta de plano para o seminário:

1) Conceitos básicos de interatividade
. O que é interatividade?
. Interatividade X Interação
. Conceito de ‘interacionismo’
. Níveis de interatividade - Podemos falar em níveis?
 
2) Propostas de discussões:
. Interação e socialização
. Existe a possibilidade de um terceiro, fora do processo de interação, avaliar o grau de interatividade?
. As tecnologias digitais potencializam a interatividade? Como?
. Seria possível construir um sistema computacional que possa avaliar a interatividade?

3) Interatividade e educação: potencialidades para o aprendizado

4) Interfaces
. Exemplos de recursos interacionais


Abraços!

segunda-feira, 23 de abril de 2012

Seminários - Objetos de Aprendizagem


Com esse post, pretendo fazer um pequeno comentário a respeito do tema a ser abordado no seminário dos colegas Júlio e Daniel, trazendo também algumas inquietações minhas e tentando colaborar um pouco com o debate.
Pois bem, inicialmente, pensando a respeito do tema, o que seria realmente um objeto de aprendizagem? Um recurso tecnológico? Um software? Uma animação? Um quebra-cabeças?
Qualquer processo de ensino/aprendizado que utilize o suporte tecnológico pode ser considerado um OA? Onde fica o aprendizado?

Trago aqui uma definição interessante proposta por Wiley (2000), Rehak e Mason (2003), citados por Silva (2011)1, em que os OA seriam recursos digitais padronizados, com as características de acessibilidade, reutilização, durabilidade e interoperabilidade.
A ideia é que os objetos de aprendizagem estejam disponíveis, sob licenças livres e de acesso aberto, para funcionar em diferentes arquiteturas (sistemas operacionais, por exemplo) e diferentes contextos, sendo necessário seguir determinados padrões para a construção dos OA para que seja possível acessá-los, reutilizá-los e disponibilizá-los em diferentes repositórios (ou plataformas), geralmente os ROA´s (Repositórios de Objetos de Aprendizagem).
Obviamente, um OA não deve ser apenas um recurso digital desprovido de contexto. Além das questões técnicas envolvidas no desenvolvimento de um OA, a questão pedagógica, o design pedagógico, é de fundamental importância, uma vez que estes recursos devem fundamentalmente viabilizar o aprendizado.

Pensando nisso, fico preocupado com o entusiasmo com que muitos profissionais ligados à educação vêem a utilização das tecnologias digitais, incluindo neste contexto os OA, na educação, dando mais atenção aos aspectos técnicos de construção sem o devido cuidado com os princípios da aprendizagem. Já tive a oportunidade de ver softwares fantásticos do ponto de vista estético, porém, que funcionavam quase que como um filme, proporcionando muito pouca ou nenhuma interação direta dos participantes.
Nesse contexto, penso que não adianta muito a criação de OA dotados dos mais variados recursos, como, por exemplo, som, imagens em 3D, realidade virtual, dentre outros, que funcionem apenas como simples entretenimento. Daí a importância da participação de equipes multidisciplinares e especialistas em várias áreas do conhecimento na criação dos OA, para que estes tenham a possibilidade de proporcionar uma aprendizagem realmente significativa.

Algumas propostas para discussão:

Podemos considerar um texto em formato digital (PDF, por exemplo) um OA?
Para ser considerado um Objeto de Aprendizagem é necessário que este seja sempre digital? Nesse caso, precisaríamos denominá-los, como alguns autores, de Objetos Digitais de Aprendizado?
Pensando que uma aprendizagem mais efetiva e significativa seja fruto de uma participação ativa e colaborativa dos aprendentes, as equipes desenvolvedoras de OA devem incluir somente especialistas ou a parte “aprendente”, os alunos, também deveria participar da concepção? Em que nível isso poderia ou deveria acontecer?

É, meu caro Júlio, o tema Objetos de Aprendizagem realmente não é fácil! Talvez por isso mesmo renda grandes discussões...

Até o seminário!!!


1 SILVA, Robson Santos da. Objetos de Aprendizagem Para Educação à Distância. São Paulo: Novatec Editora, 2011.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Reflexões sobre Cibercidadania


A definição do termo Cidadania é um tanto quanto ampla, mas de certa maneira diz respeito ao conjunto de direitos e deveres dos sujeitos, cidadãos, de um país ou Nação. Então, por analogia, podemos definir Cibercidadania como a cidadania no ambiente digital, certo? Vejamos!!!
Algumas características únicas das redes digitais terminam por ampliar o conceito de cidadania. A liberdade de ir e vir, por exemplo, ganha novos contornos quando apoiada pelas redes, uma vez que é possível, em fração de segundos, “estar” em lugares diferentes ou em vários lugares ao mesmo tempo. A comunicação entre pessoas em pontos diametralmente opostos ocorre como se estas estivessem frente à frente ou a poucos metros de distância entre si.
O poder territorializante e desterritorializante do ciberespaço - Lemos (2009) - promove a criação de novas fronteiras e a ampliação dos limites das que já existem, criando a necessidade de novas discussões a respeito do significado de território, incluindo aí os territórios digitais. Definitivamente, as fronteiras entre nações não mais existem no ciberespaço.
Por outro lado, a cidadania exige obrigações que devem ser respeitadas para que todos possam conviver em harmonia. Os deveres do cidadão para com o estado e com seus pares teriam a função de manter uma organização política que, julga-se, seja fundamental para que possamos exercer plenamente nossos direitos. Entretanto, deve-se ter o cuidado com o real propósito de muitos desses deveres, para evitar que a função destes esteja travestida de significados menos nobres, como, por exemplo, o controle e a domesticação do homem.
De forma semelhante, o ciberespaço apresenta um campo fértil para a proliferação de muitas das desigualdades sociais, dentre as quais inicialmente destaco o monopólio dos padrões proprietários, seja de hardware, software ou infraestrutura, e a não democratização do acesso à internet.
De uma forma geral, acho qualquer tipo de monopólio algo bastante nocivo, que tende a engessar a criatividade, a inventividade e a evolução. Os padrões fechados e as barreiras construídas pelas patentes e pela propriedade intelectual no desenvolvimento de softwares proprietários, por exemplo, ao meu ver, tendem a prejudicar a criação de melhores soluções, uma vez que apenas um pequeno grupo de pessoas pode ter acesso ao código fonte dos programas - muitas vezes, apenas à partes do código -, reduzindo as possibilidades de um trabalho de melhor qualidade. A ideia de que ações para o desenvolvimento de softwares somente podem ser desenvolvidas mediante o incentivo financeiro garantido pela propriedade intelectual sofre um tremendo golpe quando observamos o modelo de criação e distribuição do software livre e do licenciamento livre, onde um grande número de pessoas dedica parte do seu tempo para criar, divulgar, aperfeiçoar e distribuir softwares, onde, na maioria dos casos, não existe nenhuma remuneração direta originada pela circulação desses softwares.
Por outro lado, de que adianta falar em cibercidadania, cibercultura ou ciberdemocracia quando um grande número de pessoas encontra-se à margem deste processo, os “marginais” digitais, que não possuem nenhum tipo de acesso a informática ou as tecnologias digitais? Creio não ser possível falar do enorme potencial das tecnologias para promover a inclusão através da democratização da informação se essas tecnologias não estão ao alcance de todos.
Este forte link entre cidadania e as redes digitais, conforme afirma Bustamante (2010), além de mostrar a importância das tecnologias digitais em vários contextos outros da sociedade contemporânea, nos leva a pensar não só a respeito da importância do acesso democrático a essas tecnologias, como também à necessidade de fortalecer as práticas de compartilhamento e colaboração e a livre circulação de informações e ideias.
Obviamente, a cibercidadania está em um contexto muito mais amplo que a luta por padrões abertos e a democratização do acesso à tecnologia, porém, creio que se quisermos ser e ter cidadãos e não apenas meros sujeitos no mundo digital, esses dois passos podem ser considerados boas práticas para a formação do cibercidadão.

terça-feira, 3 de abril de 2012

Ciberdemocracia: o próximo passo da cibercultura?

No mundo atual, permeado e interconectado pelas tecnologias digitais, vários são os termos criados para identificar os movimentos surgidos e/ou potencializados por essas tecnologias. Um desses termos é a cibercultura.
Lemos caracteriza a cibercultura como a relação entre os computadores, as redes e os processos comunicacionais, fato que provocou profundas mudanças nos hábitos e práticas socioculturais e políticas da sociedade contemporânea. O autor afirma ainda que a cibercultura amplia as possibilidades de conscientização social através de práticas colaborativas e compartilhadas de troca, criação e circulação de informação, potencializados pelos princípios da cibercultura: emissão, conexão e reconfiguração.
A difusão de informações, outrora reinante na cultura massiva, perdeu sua força para um modo descentralizado de produzir, circular e recircular informações, onde qualquer pessoa tem a possibilidade de ser o agente da informação, criando, modificando, remixando e distribuindo em vários formatos e para qualquer parte do mundo, desviando o monopólio da informação das grandes empresas de mídia global.
O ciberespaço, tipico da cibercultura, expandiu os limites das fronteiras físicas e deu novos significados às palavras tempo e espaço. Em qualquer lugar do globo e a qualquer tempo é possível trocar informações e manter um alto grau de interatividade com um grande número de pessoas, com culturas, pensamentos e ideias diferentes, criando um ambiente colaborativo e compartilhado, favorecendo a criação de novas culturas e saberes e a construção de novos conhecimentos.
Com relação ao futuro da cibercultura, será que estamos mesmo caminhando para um mundo mais democrático, chamado por Lemos de ciberdemocracia, onde não existirão barreiras para uma comunicação livre, aberta e colaborativa, ou estaremos recriando uma comunicação padronizada, centralizada e monopolizada?
Mesmo concordando com a afirmação de Santaella, que alerta para o fato das redes digitais funcionarem apenas como canais para a transmissão de informações, não sendo as únicas responsáveis pelas transformações que estamos vivenciando, elas têm papel destacado e influenciaram extraordinariamente as revoluções socioculturais contemporâneas.
O suporte das tecnologias digitais foi fundamental para o advento da cibercultura, sendo que a sua expansão está intimamente ligada ao desenvolvimento tecnológico, que ora é visto como a solução para todos os problemas da humanidade, ora é visto como o grande responsável pela desumanização da sociedade. Dessa forma, vejo com mais atenção alguns movimentos que se apresentam na internet, em especial o advento da “cloud computing”, ou “computação em nuvem”.
Inicialmente, a ideia de armazenar dados de forma “centralizada”, que podem ser sincronizados e acessados em qualquer lugar, independente de plataforma computacional ou sistema operacional, parece algo bastante vantajoso e condizente com um munto globalizado e conectado. Porém, não é difícil imaginar a possibilidade de que grandes organizações unam suas infraestruturas para prover esses serviços com a intenção de formar espécies de cartéis informacionais e começar a ditar regras e privar esses espaços, que nasceram livres e descentralizados, como, no caso, a internet.
A possibilidade de controlar os acessos à nuvem, por exemplo, pode sugerir que futuramente não só a utilização dos softwares disponíveis seja cobrada, como também o próprio acesso às nossas informações pessoais seja cerceado, privando um grande número de pessoas de dispor dessas tecnologias.
De antemão, prefiro acreditar que na rede sempre haverá espaço para a liberdade, a colaboração, o compartilhamento e o ativismo, típicos da cibercultura, que continuem possibilitando a multiplicação dos saberes e o crescimento de uma consciência social e inteligência coletiva, que favoreçam a instauração de uma verdadeira democracia sócio-digital-cultural.

terça-feira, 27 de março de 2012

Os territórios da cibercultura e os saberes coletivos


Este post refere-se às minhas reflexões após as leituras dos textos de Lemos1 e Corrêa2.

As novas tecnologias digitais promoveram, e promovem, a criação de novas fronteiras e a expansão dos limites das já existentes. Falar em limites territoriais na cibercultura é algo tão complexo que se faz necessário abrir novas discussões a respeito do significado da palavra território.
O alcance global proporcionado pela internet faz com que um número cada vez maior de pessoas transcenda os limites impostos pelo tempo e o espaço, conseguindo se fazer presente e se comunicar, tudo ao mesmo tempo, em locais separados por milhares de quilômetros e com um número cada vez maior de pessoas.
O ciberespaço, segundo Lemos, favorece novos processos de “desterritorialização” e também de “territorialização”, uma vez que, além de trazer informações a respeito de locais dos quais não fazemos parte fisicamente, promove a criação de novos territórios digitais. Mesmo quando estamos conectados à internet no conforto territorializado dos nossos lares, podemos estar desterritorializados ao participar de eventos ou viver experiências que não fazem parte efetivamente da nossa cultura local.
As possibilidades das tecnologias digitais, dentre elas a facilidade em romper as fronteiras físicas, facilmente ultrapassadas pelo alcance do ciberespaço, além da possibilidade de se manter uma comunicação mais interativa e não apenas receptiva de outras mídias, como, por exemplo, a televisão, fez das tecnologias em rede um ambiente fértil para a recombinação de vários processos comunicativos, inclusive o que podemos chamar de reestruturação da indústria cultural.
As comunicações em rede proporcionam um alto grau de interatividade entre um grande e variado número de pessoas, com culturas, pensamentos e ideias diferentes, o que pode favorecer a recombinação dessas culturas para a criação de novos produtos culturais. A recepção da informação, fato predominante na cultura massiva, reduzia drasticamente as possibilidades de criação, uma vez que esse tipo de comunicação é pautado na reprodução pura e simples. A cibercultura, ao contrário, fez surgir uma gama de possibilidades nunca antes vista, criando condições para que as pessoas sejam também autoras e produtoras de informações, proporcionando um ambiente colaborativo e compartilhado capaz de influenciar a criação de novas culturas e saberes, e por que não dizer, multiculturas.
Mas será que estamos preparados para todas as mudanças, cada vez mais rápidas, provocadas pelas tecnologias digitais? Conseguiremos nos adaptar às mudanças exigidas pelas revoluções tecnológicas que aconteceram e que ainda estão por vir? É possível construir novos saberes coletivos em rede ou simplesmente criaremos um novo espaço global onde frutificam ideias homogêneas que refletem o pensamento das classes dominantes?
Prefiro acreditar que o melhor caminho é nos aprofundarmos cada vez mais nos estudos das potencialidades das tecnologias digitais. A alienação não deverá, jamais, fazer parte de uma sociedade que dispõe das possibilidades informacionais como as que estamos vivenciando.
Saber explorar os potenciais das redes digitais de comunicação pode proporcionar uma verdadeira revolução social que, creio, ainda está por vir. Uma revolução que promova uma verdadeira inclusão sócio-digital e permita que a colaboração e o compartilhamento sejam muito mais do que apenas disponibilizar uma foto ou um arquivo em uma rede social, e sim que se constituam em práticas comuns em todos os âmbitos da sociedade.


1 LEMOS, André. Cibercultura como território recombinante. In: TRIVINHO, Eugênio; CAZELOTO, Edilson. (Orgs.). A cibercultura e seu espelho: campo de conhecimento emergente e nova vivência humana na era da imersão interativa. São Paulo: ABCiber; Instituto Itaú Cultural, 2009. p. 38-46. Disponível em: <http://abciber.org/publicacoes/livro1/a_cibercultura_e_seu_espelho.pdf>. Acesso em: 24 março 2012.

2 CORRÊA, Elizabeth S. CIBERCULTURA: um novo saber ou uma nova vivência? In: TRIVINHO, Eugênio; CAZELOTO, Edilson. (Orgs.). A cibercultura e seu espelho: campo de conhecimento emergente e nova vivência humana na era da imersão interativa. São Paulo: ABCiber; Instituto Itaú Cultural, 2009. p. 47-51. Disponível em: <http://abciber.org/publicacoes/livro1/a_cibercultura_e_seu_espelho.pdf>. Acesso em: 24 março 2012.

segunda-feira, 26 de março de 2012

Diálogos com Bauman - Vídeo


Diálogos com Bauman

Muito boa a entrevista com Bauman. Em um vídeo1 curto ele consegue refletir sobre pontos importantes a respeito da condição social do homem pós-moderno.
Duas passagens da entrevista me chamaram bastante atenção: primeiro, com relação ao pensar o coletivo (ou o não pensar) da sociedade atual. Segundo, o modelo de relacionamento criado pelas redes sociais.
De fato, na velocidade do mundo atual, percebe-se que as pessoas estão cada vez mais preocupadas com o bem-estar individual em detrimento do bem-estar coletivo. O clima de competição em diversos seguimentos da sociedade, seja por uma vaga no mercado de trabalho ou por uma vaga no estacionamento de um shopping, por exemplo, pode ter favorecido o surgimento, ou crescimento, do “homem-individualis” (grifo nosso).
Com relação ao modelo de relacionamento, Bauman afirma que hoje em dia vivemos todos em uma multidão e sós ao mesmo tempo. Na “geração facebook”, denominada por Bauman, romper relações e tão natural e espontâneo quanto mantê-las: simples atos de conectar e desconectar.
Será que estamos nos tornando seres cada vez mais individualistas e superficiais, onde os laços afetivos e os anseios coletivos tornam-se meras utopias? Sera que a velocidade e fluidez do mundo atual tornaram a superficialidade algo corriqueiro? É possível que o avanço das tecnologias digitais contribuiu definitivamente para se instaurar essa nova ordem social?
É fato que as novas tecnologias influenciam cada vez mais a forma como estudamos, trabalhamos, nos entretemos, nos comunicamos, nos relacionamos e até como pensamos; porém creio não ser possível afirmar, como uma verdade universal, que essas tecnologias são as responsáveis pelo egocentrismo social que nos espreita.
Um exemplo da utilização das tecnologias digitais a favor do coletivo, mostrando que ainda podemos nos unir para discutir temas relevantes, é a utilização das redes sociais digitais para fomentar e organizar ações de interesse comunitário, como, por exemplo, a deposição de um ditador do mundo árabe ou levar adiante manifestações contra a desigualdade social e a ganância empresarial em várias partes do mundo (Ocupe Wall Street).
Um outro exemplo que podemos citar diz respeito ao software livre. Quando poderíamos imaginar que um modelo de criação e distribuição como esse seria viável em uma sociedade capitalista? Quando poderíamos pensar que um enorme grupo de pessoas ao redor do mundo dispõe de uma parte do seu tempo para dedicar a criação, aperfeiçoamento, distribuição, divulgação, dentre outras ações, de softwares de forma espontânea, onde, em muitos casos (arriscaria dizer que na maioria deles), não há nenhuma remuneração direta originada pela circulação desses softwares?
Mesmo que estejamos, infelizmente, vivendo em uma era onde o “ter” vale mais que o “ser”, não acho que as tecnologias digitais sejam as responsáveis pelo enfraquecimento de muitos dos valores sociais no mundo pós-moderno; afinal, essas tecnologias estão disponíveis para o uso, sendo que cada um de nós o faz da maneira que achar melhor. O que falta na maioria dos casos é uma maior compreensão dos potenciais das tecnologias digitais para que elas sejam utilizadas para o surgimento e fortalecimento de uma sociedade mais crítica, coletiva e participativa, que favoreça a inclusão sócio-digital dos seus membros em busca da conquista da cidadania.

1Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=POZcBNo-D4A

terça-feira, 13 de março de 2012

A Modernidade Líquida: prefácio e capítulo 3

As leituras dos textos de Modernidade Líquida (2001), obra do sociólogo polonês Zygmunt Bauman, mais especificamente o prefácio, Ser Leve e Líquido, e o capítulo 3, Tempo/Espaço, trazem à tona algumas das discussões a respeito de temas ligados a atual sociedade.
Inicialmente, o autor trás as metáforas da “fluidez” ou “liquidez” como representantes do atual estágio da era moderna. Para o autor, os fluidos, diferentemente dos sólidos, possuem algumas características que melhor representam a era atual, como, por exemplo, a relação com o tempo e o espaço. Os fluidos não possuem uma forma inicial definida e, por não manterem qualquer forma com facilidade, estão sempre prontos a mudá-la, de acordo com o recipiente que lhes é apresentado. Os sólidos, por sua vez, por possuírem uma forma definida estão sempre “fixos” no espaço, conferindo pouca importância ao significado de tempo, já que, a priori, tenderão a manter sempre a mesma forma. Para os fluídos, o “tempo” conta mais do que o “espaço”, uma vez que os espaços tomados pelos fluídos somente serão ocupados em um determinado instante.
Segundo Bauman, a mobilidade, a inconstância e a rapidez, típicos dos fluídos, podem ser representados na modernidade através da nova importância dada àquilo que é durável. A durabilidade, outrora reconhecida e alardeada como característica importante dos produtos à venda, por exemplo, se mostra hoje um tanto quanto frágil diante da rapidez com que eles são substituídos. Para os grandes empresários da era moderna, a substituição, e não o durável, proporciona melhores margens de lucro, diferentemente do que em épocas passadas, onde o que importava realmente era fixar suas posses e repassá-las através das gerações familiares.
No capítulo 3, Bauman promove uma reflexão sobre tempo e espaço através da ótica da “modernidade leve” e da “modernidade pesada”.
Com relação ao espaço, neste caso o público não civil (não propício a práticas individuais de civilidade), o autor diferencia duas categorias: espaços que desencorajam a permanência e não favorecem a interação, e espaços sem interação social real, que privilegiam, sobretudo, o consumo. Os espaços da primeira categoria possuem ambientes imponentes, sem aconchego, como verdadeiras fortalezas, servindo para serem admirados e não visitados, tais como muitas praças cercadas por seus suntuosos prédios e tomadas pelo vai-e-vem das pessoas. Na segunda categoria, a função primordial seria transformar as pessoas em consumidores, sendo o consumo um ato absolutamente individual e não coletivo, por mais cheios que estejam os lugares de consumo, tais como shopping centers e pontos turísticos, por exemplo.
A ideia de espaço e tempo, segundo o autor, vem mudando com o advento da modernidade. Há algum tempo, os significados de palavras como “longe” e “perto”, “cedo” e “tarde”, não eram muito diferentes, uma vez que expressavam o esforço necessário para um ser humano percorrer uma determinada distância. Mesmo quando essas distâncias eram percorridas a pé ou a cavalo, por exemplo, a diferença de tempo e espaço não era tão gritante quanto hoje, uma vez que percorrer uma determinada distância usando as próprias pernas ou valendo-se da tração animal em nada se compara, com relação a tempo e espaço, a diferença abissal em percorrer distâncias a pé ou à bordo de um avião supersônico. O “hardware” passou a determinar a relação tempo-espaço.
Acontece que a era do hardware, ou “modernidade pesada”, definida por Max Weber como “era da racionalidade instrumental”, onde o tamanho das máquinas e a quantidade de aço e concreto estavam relacionados ao poder, ficou para trás. Agora, surge o “capitalismo de software” e da “modernidade leve”.
Na era do software, conforme Bauman, as diferenças entre tempo e espaço não mais existem. Os limites impostos pelo espaço perderam o sentido, pois pode-se, na era do software, alcançar todas as partes do espaço a qualquer momento, em qualquer instante. A esse respeito, pesam as possíveis consequências do imediatismo da era do software, onde o instantâneo, a realização imediata, podem significar, dentre outras coisas, a perda gradativa do interesse pela realização.
Bauman, em uma comparação entre as modernidades pesada e leve, desconstrói a ideia de que elas sejam totalmente diferentes e que não tenham nenhuma conexão. Para Bauman houve, sim, uma mudança de conteúdo, uma nova roupagem, onde, na era do software, as pessoas que se movem mais rapidamente, no ato, mandam nas que não podem deixar o seu lugar ou não conseguem mover-se com tanta rapidez. Ou seja, na modernidade leve, ou líquida, mandam os que são livres, “desengajados”, que não sentem remorso em substituir, que evitam o durável e cultivam o desapego.
Na era moderna estamos cada vez mais acostumados ao instantâneo, à velocidade proporcionada, principalmente, pelo avanço das tecnologias digitais, que estão cada vez mais presentes e disseminadas e possuem a capacidade de influenciar a vida humana das mais variadas formas. O ciberespaço, esse ambiente dotado de comportamento fluido, típico da modernidade, mudou, e vem mudando, radicalmente o convívio humano, e, embora em um primeiro momento esteja associado ao desapego, ao súbito, pode favorecer e proporcionar construções coletivas e colaborativas através de ações participativas dos seus navegantes.

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001 (Prefácio e capítulo 3).